Santar

PAISAGEM DE EXCEÇÃO INSERIDA COM AS SUAS GRANDES PROPRIEDADES VINHATEIRAS E UM PATRIMÓNIO CONSTRUÍDO ERUDITO E RURAL DE GRANDE RELEVÂNCIA.

Santar é uma vila beirã anterior à nacionalidade, no concelho de Nelas. Surpreende pelo seu património cultural e pela beleza da sua paisagem marcada pela vinha, rematada no horizonte pela serra da Estrela a sul e pela serra do Caramulo a norte. Aqui, o granito marca presença e transforma-se numa profusão de muros, fontes tanques e edifícios fidalgos, agrícolas, rústicos e religiosos. Por trás destes muros, suportados por muros, estendem-se jardins armados em terraços e quilómetros de sebes em buxo talhado – incluindo as amadas “carreiras” da Beira – escondem-se tanques. Ouvem-se fontes, abrem-se roseirais e vinhas. A luz e ar limpo da beira sabem envolver de modo inconfundível todo este cenário. São eles, talvez, o maior segredo destas casas fidalgas que transportam nomes antigos de Cunhas, Pais do Amaral, Melos, Bragança, Almeida Castelo Branco, Silveira Pinto, Amaral Reis, Ibérico Nogueira e Portugal Leal de Loureiro…

Hoje em Santar nasce um projeto inédito – Santar Vila Jardim – que desde 2013 quebra muros e constrói pontes para unir vontades e juntar jardins vizinhos. Casa dos Condes de Santar e Magalhães, Casa Ibérico Nogueira, Casa das Fidalgas, Casa da Magnólia, Misericórdia de Santar, Jardim dos Linhares…

12,47 km²

Área

83,6 hab/km²

Densidade populacional

1 042

Habitantes

40° 34' 17" N 7° 53' 28" O

Coordenadas

Santar Vila Jardim

HISTÓRIA

O topónimo SANTAR perde-se nas memórias do tempo, sem, no entanto, podermos deixar de referir que o sítio é lugar de assento e fixação humana desde o neolítico até aos dias de hoje. Por aqui andaram nossos antepassados há cerca de 5.000 anos, como caçadores e recolectores. Por aqui se fixaram mais tarde os iberos, os celtas, os romanos e mouriscos, até à Reconquista potenciada por Afonso Henriques, que cristianizou o território e o integrou no reino de Portugal.

Durante séculos, a vila de Santar esteve inserida no território de Senhorim. Desde 1852 a freguesia passou a pertencer ao concelho de Nelas, distrito de Viseu. Localiza-se a meia encosta na vinhateira região do Dão, tendo como pano de fundo as serras da Estrela e Caramulo. Elevada, em 1928, à categoria de vila, Santar é uma das mais antigas localidades do país, distinguindo-se pelo magnífico conjunto de património edificado onde sobressai o granito como material de construção.

Ocupada desde tempos imemoriais, é a presença romana que mais vestígios arqueológicos deixa na região, nomeadamente nos arredores de Santar, Senhorim e Canas de Senhorim.

 

As inquirições de 1258 referiam a existência de uma via, provavelmente de origem romana, que ligava Senhorim a Vilar Seco e de uma outra, entre esta última localidade e Santar de que ainda há vestígios.

Como na maioria das vilas antigas, existe também uma lenda que a palavra Santar estaria ligada à passagem vitoriosa, nos primórdios da Idade Média, de um rei – segundo uns D. Afonso II – que aqui teria mandado o seu exército “assentar” arraiais para um merecido descanso depois de uma batalha. A lenda é curiosa, mas a origem do nome parece ser bem diversa estando, porventura associada à permanência dos visigodos na Península Ibérica já que, segundo alguns autores, deriva de um nome próprio de origem germânica Sentarius, referido em documentação desde o século X, sob a forma de Senteiro.

Em 1514, no âmbito da reforma dos forais levada a cabo por D. Manuel, Senhorim – a cujo concelho Santar pertencia – recebia um novo foral que vinha substituir o outorgado por D. Afonso III em 1253.

A partir do século XVI, a vila começou a desenvolver-se quando D. Luís da Cunha, senhor de Sabugosa, Óvoa e Barreiro, e proprietário do Casal Bom em Santar, recebe da coroa o paço medieval dos antigos donatários, onde se instala.

Posteriormente, em 1609 – já durante o período filipino – D. Pedro da Cunha, fidalgo da casa de Felipe II, reformulava o antigo paço medieval, construindo o imponente Paço dos Cunhas em consonância com o prestígio e poder económico que detinha na região. Será nesse contexto que Santar passa a ser conhecida como a sede das Cortes da Beira.

À volta do Paço dos Cunhas, nascem outras casas senhoriais que se vão afirmar na região como foi o caso da que viria a ser a Casa dos Condes de Santar e Magalhães e a Casa das Fidalgas. Esta última, de construção setecentista, terá sido erguida junto a uma torre medieval aí existente e posteriormente destruída. Será também por esta altura que serão instituídas várias capelas, umas privadas, outras de irmandade.

Por doação de D. Lopo da Cunha – o último desta família aqui a residir – foi levantada, em 1637 a Igreja da Misericórdia, em cujo jardim – um verdadeiro belvedere sobre um jardim de vinha – se podem, ainda hoje ver, algumas árvores notáveis nomeadamente araucária araucana, criptoméria, abetos, ciprestes e cameleiras.

Fiel à causa filipina, D. Lopo da Cunha será obrigado a exilar-se em Espanha, em 1641, depois de se ter malogrado uma conspiração, em que participou para depor D. João IV.

Os seus bens foram confiscados e a pedra de armas da família retirada da fachada do antigo paço. Terminavam, assim, sem glória as Cortes da Beira.

Contudo, o tempo era de mudança. Em recompensa por se terem posicionado a seu lado, na luta contra Espanha, o duque de Bragança, agora rei de Portugal, faz ascender ao poder outras famílias aristocráticas e membros da alta burguesia. Se em Santar a Restauração fizera cair os Cunhas, também faria erguer-se outras casas, nomeadamente a dos Pais do Amaral.

Em 1852, a reforma administrativa cria o concelho de Nelas que incorpora territórios outrora pertencentes aos concelhos de Canas de Senhorim e de Senhorim.

Como outras regiões do país, Santar sofreu os efeitos da passagem das tropas francesas durante a III Invasão comandada por Massena e posteriormente os danos causados pela guerra civil entre os partidários de D. Miguel e os de D. Pedro IV.

Com o advento da República, os concelhos tiveram novas reformas administrativas, as quais ficaram muito aquém do desejado. Com o Estado Novo, o poder autárquico ficou totalmente subjugado pelo poder central do ponto de vista administrativo e político. Só após a revolução de 1974 o poder local passará a ser eleito livremente pelos munícipes, passando também a ter uma larga autonomia.

Santar Vila Jardim

Arquitetura Civil

A par de um vasto conjunto de edifícios religiosos, a Vila de Santar preserva, ainda hoje um núcleo muito interessante de casas de várias tipologias. A casa rural popular, a burguesa letrada e abastada e, os grandes solares, cuja existência se mistura, por vezes, com a História de Portugal.

Alguns, como o mais antigo, encontram-se em ruínas ou em avançado estado de decadência, mas outros preservam grandeza adquirida durante séculos. Apesar dos estilos, relacionado com as épocas em que foram construídos, nem sempre serem idênticos, há, contudo, um elemento comum: o granito. Usado em proporções diferentes tanto pode cobrir uma fachada como ser utilizado em muros, em varandas ou simplesmente a emoldurar portas e janelas. Das mais modestas às mais imponentes, muitas das casas da vila de Santar se irmanam na utilização da pedra desta região.

Casa dos Condes de Santar e Magalhães

Residência senhorial associada a uma propriedade agrícola e vinícola, a Casa de Santar e Magalhães é um bom exemplar de arquitetura civil maneirista onde pontuam também características barrocas e neoclássicas. Localizada no coração da vila de Santar tornou-se, após a destruição do Paço dos Cunhas, no solar de maior presença e aquele que determinaria a orientação do principal eixo viário da vila.

Apesar de ter sofrido, ao logo dos séculos, inúmeros acrescentos, não é fácil hoje distinguir as várias fases construtivas por ter havido sempre a preocupação em harmonizar os novos volumes com os anteriormente edificados.

O núcleo mais antigo terá sido construído, na viragem do século XVI para o XVII, por vontade de João Gonçalves do Amaral. Mais tarde, e após a instituição do vínculo de Santar, em 1670, o seu filho Francisco Pais do Amaral e sua mulher Francisca Pais do Amaral mandaram levantar uma capela dedicada a S. Francisco d´Assis. O templo só seria terminado pelo filho de ambos, António Pais do Amaral, em 1678, que aqui se fará sepultar. Será ainda em vida deste último que a casa volta a sofrer uma ampliação com a construção da chamada Cozinha Velha, em 1690.

De planta retangular, este magnífico espaço tem a graça de preservar no seu interior uma fonte de granito alpendrada com cobertura em cúpula esférica, ornamentada nos ângulos por pináculos e cujo entablamento é suportado por quatro colunas toscanas. Por esta altura foi também levantada no exterior da cozinha uma fonte decorada por azulejos figurativos assinados por Gabriel Del Barco e datados de 1700.

No interior da cozinha encontra-se, ainda, uma chaminé em granito, de grandes proporções e cobertura piramidal. Os pilares que a suportam bem como a respetiva cornija são ornamentados com motivos vegetalistas.

Posteriormente, já no século XVIII é acrescentado à casa um novo corpo longitudinal. Por volta de 1727, Francisco Lucas de Melo, filho do primeiro Francisco Lucas de Melo, dá início à construção das adegas, do Pátio Central e do imponente chafariz conhecido por Fonte dos Cavalos, terminada em 1790. Esta ostenta, ao centro, a pedra de armas da casa sob a qual brota água de uma máscara grotesca para um bebedouro de granito. Posteriormente a fonte viria a ser decorada com painéis de azulejos assinados por Pereira Cão.

Já no século XIX é construída no alçado virado ao jardim uma varanda corrida suportada por colunas toscanas e decorada com figuras de convite, em azulejo representando as Quatro Estações. Do início do século XX é o acrescento de uma galeria fechada também virada ao jardim e os azulejos assinados por Pereira Cão que revestem as paredes do salão.

Quanto à fachada principal, virada à rua é de uma grande sobriedade. A linearidade parietal é apenas quebrada pela existência de dois níveis de janelas de molduras de granito simples e pilastras embutidas, a que correspondem ao nível do telhado pináculos bolbosos. Ao centro da fachada, abre-se o portal encimado por uma porta de sacada com varanda de balaústres, sendo o conjunto coroado por um frontão triangular onde se inscreve a pedra de armas da família.

A separação entre a casa e a rua é feita por um conjunto de peças de granito bojudas ligadas entre si por uma grossa corrente de ferro.

A Casa de Santar e Magalhães encontra-se na mesma família desde o século XVI e com o casamento de Maria Teresa Lancastre de Mello com José Luís d´Andrade de Vasconcellos e Souza no século XX, juntam-se a representatividade das ilustres casas, com honras de parente da Casa Real, Óbidos, Sabugal, Palma, Alva e Santa Iria a esta família.

José Luís e Pedro de Vasconcellos e Souza, herdeiros deste vasto património histórico cultural, são os fundadores do projeto Santar Vila Jardim conjuntamente com a família Ibérico Nogueira e Portugal Loureiro.

Casa das Fidalgas

Apesar de muito alterada por sucessivas reformas – sobretudo nos séculos XVII e XVIII – a Casa das Fidalgas teve uma origem medieval tendo começado por ser uma torre senhorial. A fundação do atual solar, de arquitetura barroca e neoclássica, deve-se a Domingos de Sampaio do Amaral que o terá mandado levantar para residência de sua filha, D. Joana de Sampaio a qual viria a casar com João de Almeida Castelo Branco. Seriam os detentores da capitania-mor do concelho de Senhorim e os instituidores do morgado de Santar.

Não existe muita informação sobre as campanhas de obras realizadas ao longo do tempo. Contudo, e ao que tudo indica, teria sido em meados de setecentos que as de maior vulto se teriam realizado conferindo à casa o seu aspeto atual. Aliás, e segundo alguns autores, teria sido só nessa altura que a torre medieval foi demolida. A memória dessa estrutura ficaria, no entanto, no topónimo Fonte da Torre, chafariz mandado levantar, em 1789, por Rui Lopes de Sousa Alvim Lemos, no terreiro fronteiro à sua casa.

Esta residência senhorial é constituída por quatro corpos sendo a fachada principal, orientada a noroeste, dividida em três panos de dois andares onde se rasgam vãos de molduras simples e um alpendre suportado por coluna.

Na fachada posterior, virada aos jardins, destaca-se uma varanda alpendrada assente em colunas toscanas que se liga ao jardim por uma escadaria.

No interior, os tetos podem ser em masseira ou em estuque. Entre estes últimos sobressai um, com uma decoração muito invulgar de pratos encastrados formando um círculo, no centro do qual se encontra um outro prato de maior dimensão.

Na Casa das Fidalgas existe ainda um Oratório digno de nota. Executado, em meados do século XVIII, na transição do barroco para o rococó, apresenta uma decoração a verde e ouro, rica em enrolamentos e motivos decorativos que contrastam com dois cortinados vermelhos que pendem lateralmente. Sobre o fundo pintado a imitar brocado, um Cristo setecentista. A seu lado, uma escultura medieval, de madeira policroma, datada de finais do século XIV- porventura proveniente da fundação medieval da casa – representa a Virgem com o Menino. Não fazendo parte do Oratório, mas encontrando-se na sua proximidade, uma imagem barroca de S. Pedro sentado no trono com os atributos papais.

Até 1975, a casa manter-se-ia na família de origem. Seria o seu último herdeiro, Pedro Brum da Silveira Pinto, que a doaria, juntamente com a propriedade agrícola que lhe está associada, ao representante da casa real portuguesa, D. Duarte Pio e ao seu irmão, D. Miguel de Bragança, duque de Viseu, que ainda hoje a habita.